Somos “canceladores” ou bons samaritanos? Confira o 2° texto da série Rumo à presença plena

Somos “canceladores” ou bons samaritanos? Confira o 2° texto da série Rumo à presença plena

Do capítulo: II. Da consciência ao verdadeiro encontro
Aprender com aquele que teve compaixão (cf. Lc 10, 33)

por Moisés Oliveira

“Quando uma pessoa pensar diferente de mim ou do meu grupo – que seja anátema!”. Que o outro, aquele que não anda comigo, não faz parte da minha bolha, que desafia meu modo de pensar, que não se enquadra nas minhas preconcepções sobre o que é aceitável, que não se conforma à minha vontade, ou seja, aquele que, simplesmente, não sou eu, seja expulso da minha convivência, seja deixado para trás, que sofra.

Não é esse o espírito do cancelamento dos nossos tempos? Não testemunhamos a todo instante hordas raivosas cobrando sacrifícios humanos em altares ideológicos de todo tipo, pedindo cabeças, demissões, humilhações públicas e punições morais para todos os que não fazem parte de determinados grupos?

Essa é uma triste realidade dos nossos dias marcados por tristes polarizações. Como superar isso? O Papa Francisco nos mostra o caminho na mensagem para o Dia Mundial das Comunicações deste ano, na qual ele propõe o Bom Samaritano da parábola como modelo de ação para todos aqueles que buscam se comunicar – e comunicar o Evangelho aos outros.

“A boa comunicação começa pela escuta e a consciência de que outra pessoa está diante de mim”, diz Francisco, mostrando que essas foram justamente as atitudes do Samaritano que socorreu o judeu espancado por ladrões e deixado para morrer na beira da estrada.

A escolha dessa parábola como modelo é curiosa por um pequeno detalhe: o Evangelho não registra nenhum diálogo entre os dois homens, o judeu espancado e o Bom Samaritano. Não conhecemos, portanto, a comunicação que poderia ter havido entre eles. Mas aí está a beleza de tudo: a comunicação não se restringe às palavras, apesar de que provavelmente elas teriam ocorrido. O Bom Samaritano interrompeu seu caminho, deu atenção ao homem ferido, acolheu-o apesar dos muitos preconceitos culturais que cercavam seus povos, apesar da história de hostilidade que os marcava. Usando expressões típicas do universo das redes sociais, o Samaritano furou a sua própria bolha ao ir ao encontro do outro homem. “Somos convidados a ver o valor e a dignidade daqueles em relação aos quais temos diferenças”.

Essa é uma reflexão importante: nas redes sociais, nossa tendência é nos fechar em nossas bolhas, deixando-as momentaneamente somente para interagir de forma hostil com aqueles de quem discordamos. Mas não é essa exatamente a atitude do sacerdote e do doutor da lei que, na parábola, deparando-se com o estrangeiro ferido, passam ao largo porque o reconhecem como alguém que não faz parte da bolha deles, alguém que talvez até faça parte do “outro lado”? Não agem esses dois personagens os “canceladores” do nosso tempo?

Mas por que, muitas vezes, sequer prestamos atenção ao pobre homem espancado na beira da estrada? O Papa Francisco nos lembra que um dos motivos é que estamos acostumados à distração proporcionada pelo excesso de informações que nos bombardeiam incessantemente por todo lado, especialmente nas redes sociais. Esse excesso elimina o espaço para o silêncio. “Com este excesso de estímulos e dados que recebemos, o silêncio é um bem precioso, porque garante o espaço para a concentração e o discernimento”.

O papa nos convida então a nos empenhar, de coração aberto, na escuta dos outros. “A escuta emerge do silêncio e é fundamental para cuidar dos outros. Quando escutamos, damos as boas-vindas a alguém, oferecemos hospitalidade e demonstramos respeito por aquela pessoa. Escutar é inclusive um ato de humildade da nossa parte, dado que reconhecemos a verdade, a sabedoria e o valor, além do nosso próprio limitado ponto de vista. Sem a disposição para a escuta, não somos capazes de receber o dom do outro.”

Precisamos ser atenciosos às pessoas nas redes sociais, acolhê-las, dar-lhes nossa “hospitalidade”. Isso será possível na medida em que cultivarmos um diálogo pessoal com Deus, uma relação autêntica com Ele. “Nossos relacionamentos com os outros e com nosso meio ambiente deveriam alimentar nossa relação com Deus, e nossa relação com Deus, que é a mais importante, deve ser visível nos nossos relacionamentos com os outros e com nosso meio ambiente.”

| Leia aqui o documento na íntegra.

| Acompanhe todos os textos da série – AQUI.

 

da redação, por Moisés Oliveira
Jornalista, historiador e especialista em mídias sociais e em Ciência Política.
Devoto de Nossa Senhora, São Josemaria, São Miguel e do Beato Pier Giorgio.

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