A Economia de Francisco: evento reúne jovens para a construção de uma economia mais justa, inclusiva e sustentável

A Economia de Francisco: evento reúne jovens para a construção de uma economia mais justa, inclusiva e sustentável

Como construir uma sociedade a partir de uma economia mais fraterna, justa, inclusiva, sustentável e que ninguém seja deixado para trás? Este é o convite feito pelo Papa Francisco a jovens de todo o mundo que, a partir desta quinta-feira, dia 19 de novembro, participam do encontro “The Economy of Francesco” (A Economia de Francisco), que acontece de forma virtual tendo como centro das atividades a cidade italiana de Assis. A programação acontecerá até domingo, dia 21, e terá transmissão através do Vatican News e do Jovens Conectados (com tradução em português). Serão diversos momentos de estudos, reflexões e espiritualidade em lugares franciscanos históricos, como a Basílica de São Francisco, Basílica de Santa Clara, Santuário do Despojamento e Igreja de São Damião.

Na festa de São José Operário do ano passado, no dia 1º de maio, o Papa Francisco exortou os jovens economistas, estudantes, empreendedores com menos de 35 anos para pensar um processo de transformação global e os convidou para o encontro em Assis. Para Luigino Bruni, diretor científico do evento, “Graças a São Francisco e ao Papa Francisco, nasceu o mais vasto movimento de jovens sobre economia a nível internacional. E é dessa notícia que hoje a sociedade e a Igreja precisam”.

O advogado Alan Silva, o educador financeiro Matheus Machado e o economista Rafael Crozatti: alguns dos brasileiros que participam do evento. Brasil é a segunda maior delegação.

Milhares de jovens de 120 diferentes países responderam ao convite do Papa Francisco e se inscreveram. Entre eles, muitos brasileiros. Para o educador financeiro Matheus Parreira Machado, o sim ao chamado do pontífice veio a partir da sua atuação profissional, na qual sempre busca estar pautado em princípios cristãos. “O evento apareceu de forma extremamente feliz na minha vida. A oportunidade de ouvir sobre como a Igreja Católica compreende a relação da economia com o ser humano, do dinheiro com as pessoas, foi o motivador para me engajar’, conta o jovem de 33 anos.

Quando o jovem advogado Alan Faria Andrade Silva ouviu sobre o encontro, de primeiro momento achou que não se encaixava no público-alvo. Porém, fazendo o mestrado, que tinha como um tema de estudo o Centro de Refugiado da Cáritas de São Paulo (SP) e o terceiro setor, participou de um evento no qual foi citado o encontro pensado pelo Papa Francisco. “Eu achei muito interessante ouvir uma pessoa que não era da Igreja Católica falar sobre o Papa Francisco e este projeto. Comecei a acompanhar as informações do evento pelas redes sociais. Quando resolvi me inscrever, era no meio da noite e o último dia para as inscrições. Tempo depois, veio a felicidade com a resposta de que havia sido aceito. Senti que eu precisava usar meus dons para ajudar e trazer a dimensão do Direito e dos migrantes e refugiados para a economia”, conta.

A pandemia como oportunidade de reflexão e mudança 

A crise sanitária do novo coronavírus impossibilitou o formato presencial pensado inicialmente para o encontro em Assis, contudo abriu novas reflexões sobre um mundo no qual “estamos todos no mesmo barco; todos importantes e necessários”, como salientou o Papa Francisco na homilia da bênção do dia 27 de março de 2020.

“Não há quem toque no assunto ‘Economia de Francisco’ e consiga formular uma frase sem pensar na pandemia. É fato que ela trouxe à tona a desigualdade, mas é preciso pensar ‘para quem’ ela trouxe essa realidade às claras? Em um webinar com colegas da África, elas destacavam justamente que a desigualdade social no continente é ‘anunciada’ há décadas e nem por isso, as coisas mudaram. A pior pandemia que podemos viver não é a do coronavírus, mas sim, a do vírus da indiferença, em relação ao outro, ao meio ambiente e à sociedade”, analisa Machado.

Para Rafael Oberleitner Crozatti, 29 anos, mestre em economia e que também participa do evento, a atual crise sanitária, social e econômica deixa claro a incapacidade de solução dentro do atual modelo econômico, sobretudo quando observamos o mercado de trabalho, geração de renda, pobreza monetária e o acesso e garantia a direitos fundamentais, como alimentação, saúde, educação e moradia. “A Economia de Francisco propõe uma nova mentalidade econômica que salvaguarde a dignidade da pessoa humana, o cuidado da natureza e igualdade entre as pessoas. Temos trabalhado muito essa questão na Arquidiocese de Maringá (PR). Buscamos indicadores sociais do período anterior à pandemia para evidenciar que esta crise sanitária serviu apenas para aprofundar e dar maior visibilidade às desigualdades que por muito tempo convivíamos e estranhamente aceitávamos”, conta.

 

Reunião do evento no Brasil antes da pandemia: oportunidade de diálogo e construção conjunta (Vatican News)

O percurso até Assis em 12 grupos de trabalho

Desde março deste ano, mês no qual seria realizado o evento, os jovens trilham um caminho rico e engrandecedor através de 12 grupos temáticos, chamados de aldeias, que são seções de trabalhos online com temas como agricultura e justiça; energia e pobreza; lucro e vocação; políticas para a felicidade; desigualdade; business e paz;  empresas em transição; vida e estilos de vida.

A união de jovens com tantas realidades diferentes – sociais e econômicas – enriqueceu a discussão. “Trabalhamos muito em grupos virtuais para construção de projetos que foram enviados ao Comitê Central. Fizemos várias atividades, lives etc. No início, alguns jovens, em especial os europeus, não entendiam a ideia de que as ‘vozes do sul’ precisam ser escutadas e não apenas as ‘vozes do norte’. Foi um primeiro embate. Falamos de países, mas no próprio Brasil há muitas divergências de realidades. Somos a segunda maior delegação e temos muitas ideias, linhas, raciocínios e iniciativas diferentes e isso tem um impacto muito positivo no trabalho e também como desafio para trabalharmos em conjunto”, conta o jovem Alan Silva.

“As diferenças não apenas nos complementam, mas nos ensinam. Alguns já passaram por dificuldades que outros começam a viver e a partir da troca, é possível seguir caminhos que já foram conhecidos, claro, que cada país tem suas peculiaridades, mas ouvindo quem já passou por situações parecidas, fica melhor”, analisa Matheus Machado.

Papa Francisco em celebração nos jardins do Vaticano durante o Sínodo da Amazônia: pensar em uma ecologia integral (Vatican News)

Uma economia de braços dados com o meio ambiente

 Em especial com a encíclica inspirada em São Francisco, “Laudato Si’- Sobre o cuidado com a Casa Comum”, o Papa Francisco reforça a necessidade de uma mudança integral, o que inclui a relação do homem com o meio ambiente. Este tema permeou muitas das atividades e terá destaque nos próximos dias.

“Um ponto que deve somar são as experiências vindas dos países que já sentem de maneira mais aguda as consequências de um sistema econômico fragmentado, que na busca da acumulação de riqueza, não se preocupou na sua distribuição e nos danos ambientais. De fato, à luz da Laudato si’, não temos duas crises separadas – uma ambiental e outra social -, mas uma única e complexa crise socioambiental. Dessa forma, uma solução adequada requer abordagens integrais que combatam a pobreza, devolvam a dignidade aos excluídos, e, ao mesmo tempo, preserve a natureza”, diz Rafael Crozatti.

Em Assis, Papa Francisco assina a encíclica Fratelli Tutti, inspirada em São Francisco e seu testemunho de amor e diálogo com o próximo (Vatican News)

Francisco: o santo medieval que inspira um modelo de mundo melhor hoje e para o futuro

Apesar de ter vivido em uma realidade com uma distância temporal de mais de quase 800 anos, seu testemunho ainda “arrasta” os jovens e inspira a construção de uma sociedade mais fraterna. Para Matheus Machado, “os valores e princípios de São Francisco são valores de Cristo. Daquele que nos salvou, ele trouxe uma nova forma de enxergar a aplicação desses princípios na nossa vida concreta. Cuidar do mais frágil, abraçar o meio ambiente e defendê-lo, são formas de praticar Jesus que São Francisco exercitou tão bem. E agora, quando cuidamos do mais frágil, buscamos exterminar as desigualdades e protegemos e recuperamos o meio ambiente, estamos praticando Francisco. Não existe velho, ultrapassado, para quem praticar esses princípios”.

“São Francisco é atemporal. Se compreendermos a intenção e o protagonismo dele vemos que independe de época e tempo. É o mesmo espírito de Jesus Cristo, do Evangelho. O que Francisco faz é retomar o Evangelho em sua vida e sua realidade. E a proposta da ‘A Economia de Francisco’ é retomar o Evangelho em nossas vidas, nas dinâmicas econômicas e ambientais e, agora, na fraternidade universal. Para nós isso se deve através de uma experiência profunda com Jesus Cristo”, reflete Silva.

Durante a JMJ na Polônia, Papa Francisco reafirmou sua esperança nos jovens (Vatican News)

A confiança do Papa Francisco nos jovens, “os protagonistas da mudança”

Que os jovens sejam “revolucionários” e capazes de “nadar contra a corrente”, como disse o papa na JMJ Rio 2013. O pontífice diversas vezes expressou sua esperança nos jovens. “Eu sei que vocês são capazes de escutar com o coração o grito sempre e cada vez mais angustiante da terra e dos pobres na busca de ajuda de responsabilidade, isso é, de alguém que responda e não vire o rosto para o outro lado. Se escutarem os vossos corações, se sentirão portadores de uma cultura corajosa e não terão medo de arriscar e de se empenhar na construção de uma nova sociedade”, disse o Papa aos jovens na carta-convite do encontro.

Para Matheus, “os jovens conseguem ver que o progresso é importante, mas há outros assuntos que acompanham essa verdade, e o verdadeiro progresso respeita o meio ambiente, o indivíduo, a dignidade da pessoa humana. Só podemos falar que estamos progredindo, se não deixarmos ninguém para trás, do contrário, podemos até progredir financeiramente, mas estaremos regredindo humanamente”.

Juntos, os jovens estão dando importantes passos.

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