5º Domingo da Quaresma

5º Domingo da Quaresma

5_domingo_quaresmaEz 37,12-14; Sl 130(129); Rm 8,8-11; Jo 11,1- 45

Meus irmãos,

hoje celebramos o V Domingo da Quaresma, que é o último. Nós nos aproximamos do fim deste itinerário espiritual com o qual nós nos preparamos para celebrar, mais uma vez, a Páscoa de Jesus Cristo, da qual nos veio a nossa salvação.

A Quaresma não apenas nos prepara para celebrações da Semana Santa. Toda Quaresma é iluminada pela Páscoa de Jesus Cristo, a maior prova do amor de Deus por nós, pois o Filho de Deus deu a Sua vida pela nossa salvação, e o Pai dos Céus O ressuscitou, na força do Espírito Santo. Na Quaresma, nós nos deixamos iluminar pela luz de Jesus, pela luz do Seu amor, que deu a vida por nós, nos alcançando, assim a nossa salvação. E nos experimentamos a salvação que Deus nos oferece no perdão dos nossos pecados. Por isso, na Quaresma, todos nós somos convidados a fazer uma boa revisão de vida, e uma boa confissão, para que possamos celebrar a Páscoa com o coração renovado.

As leituras desta Santa Missa trataram da Ressurreição de Cristo e da nossa ressurreição, também. Esta perspectiva sustenta os nossos esforços de conversão, ao nos aproximar da celebração da Páscoa e, antes, de nossa confissão pessoal.

No Evangelho [há pouco proclamado] ouvimos o relato da ressurreição Lázaro. Este relato está relacionado com os trechos do Evangelho lidos nos Domingos anteriores. E a escolha destes cinco trechos do Evangelho remonta ao antigo Catecumenato, que era a preparação daqueles que seriam batizados na Páscoa, que se intensificava na Quaresma. Tendo em vista o Batismo dos Catecúmenos, bem como o batismo daqueles que já o receberam, estes cinco trechos foram escolhidos e estão intimamente relacionados. No I Domingo da Quaresma ouvimos o relato das tentações de Jesus, assinala de um lado a Sua solidariedade conosco, pois manifesta que Ele assumiu a fraqueza de nossa condição humana. No II Domingo da Quaresma ouvimos o relato da Transfiguração do Senhor, na qual se manifesta da glória que o Filho de Deus tem com o Pai dos Céus desde toda a eternidade, que antecipa a Sua ressurreição, e que anuncia a nossa glorificação. No III Domingo da Quaresma ouvimos o “relato da samaritana”, no qual Jesus anuncia a “Água viva”, o Espírito Santo, com Quem se é fiel a Deus, no dizer de Jesus, se é adorador do Pai “em espírito em verdade” (Jo 4, 23). Semana passada, no IV Domingo da Quaresma, ouvimos o relato da cura do cego de nascença. À pergunta de Jesus “Tu crês no Filho do Homem?”, o cego lhe respondeu por todos nós: “creio, Senhor” (Jo 9, 38). Na cura deste cego de nascença está Jesus Cristo, a luz do mundo, que quer abrir o nosso olhar interior, para que a nossa fé se torne cada vez mais profunda e, como o cego, possamos reconhecê-Lo como o nosso Salvador. Jesus Cristo é a luz do mundo, e ilumina as nossas vidas, ilumina as nossas obscuridades e nos leva a viver como “filhos da luz” (Jo 9, 35).

O Evangelho [há pouco proclamado] nos coloca diante da morte de um homem, Lázaro, e de sua ressurreição realizada por Jesus. Este é o último e o maior dentre os milagres (“sinais”) operados por Jesus fixados no IV Evangelho. Este milagre prepara os Seus discípulos para compreender a Sua morte e a Sua ressurreição, que ocorrerão em Jerusalém.

A morte é um mistério. Manifesta o limite da nossa existência. Deus nos criou para a vida e o pecado de nossos primeiros pais, o Pecado Original (cf. Gn 3) fez com que o mal e a morte penetrassem a criação e, por extensão, as nossas vidas (cf. Rm 3, 23). No entanto, Deus nos oferece o perdão, Deus nos oferece a redenção. No próprio relato do Pecado Original Deus anuncia o Salvador e o dom da salvação: “Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a dela. Esta te ferirá a cabeça e tu ferirás o calcanhar” (Gn 3, 15). Se o pecado de Adão fez com que a morte reinasse sobre a humanidade, só o sacrifício de amor de Cristo libertaria a humanidade da morte. A morte de Jesus. A Jesus, morto na carne, foi restituída a vida no Espírito, como ouvimos na 2ª. leitura. E Jesus, como Seu corpo glorificado inaugura a nova condição da humanidade. N’Ele somos novas criaturas, a participar da plenitude da vida de Deus.

Jesus, ao ser chamado pelas irmãs de Lázaro, disse: “Esta doença não leva à morte; ela serve para a glória de Deus, para que o Filho de Deus seja glorificado por ela” (v. 4). A glória é um atributo divino. Só a Deus se presta a glória. No IV Evangelho, a glória de Jesus, o Filho de Deus encarnado (cf. Jo 1, 14) se manifesta na Sua Páscoa, na a Sua morte e ressurreição. Assim, a ressurreição de Lázaro servirá para que o Filho de Deus seja glorificado, seja para que Lázaro participe, antecipadamente, da glória do Filho de Deus, participe, antecipadamente, de Sua ressurreição.

A ressurreição de Lázaro nos põe diante na questão da morte, o último mistério de nossa existência. A comunhão com Cristo nessa vida nos prepara para superar o limite da morte para viver com Ele nos céus, na Vida Eterna.

A ressurreição de Lázaro é o sétimo e o maior sinal que consta no IV Evangelho. De ante da morte de Lázaro e da própria morte Jesus diz “eu sou a ressurreição e a vida” (v. 25). A ressurreição de Lázaro é a prefiguração da ressurreição de Cristo, é o Seu maior milagre, e é contado por S. João no final da série de “sinais” de Jesus, o último milagre, imediatamente antes de Sua morte.

É notável como Jesus se apresenta a Marta. Ele já serve de uma expressão importante do Antigo Testamento anterior à primeira Páscoa. Deus ao eleger Moises como o profeta da libertação do Povo de Israel apresentou-se na sarça ardente, e Lhe disse “eu sou”,  “eu sou aquele que que sou” (Ex 3, 14). O Evangelho de João assinala alguns momentos em que Jesus se apresenta com a mesma expressão (cf. 4, 26; 9, 37; 11, 25). Jesus assim, Se releva como o Filho de Deus encarnado, que veio realizar o novo Êxodo, que veio realizar nova Páscoa, e selar a nova definitiva Aliança. Diante da morte de Lázaro, e diante da própria morte que sofrerá em Jerusalém, Jesus diz “Eu sou a ressurreição e a vida” (v. 25), e o faz servindo-se da expressão “Eu sou” (cf. Ex 14, 3), e ocorre nos lábios de Jesus várias vezes, e que meditamos nas duas ultimas semanas. Para a Samaritana, Jesus lhe disse: “Sou eu, que falo contigo” (Jo 4, 26); antes de dar a vista ao cego de nascença, Jesus disse: “eu sou a luz do mundo” (Jo 9, 5). E no relato que hoje ouvimos, Jesus se serve da mesma expressão “Eu sou”. Assim, Jesus manifesta a Sua divindade através de Sua humanidade: Ele é o Verbo encarnado, o Filho de Deus, que veio nos salvar. E na ressurreição de Lázaro vemos a nossa ressurreição, a nossa redenção, a nossa salvação.

Jesus disse a Marta “Eu sou a ressurreição e a Vida” (v. 25) e lhe pergunta: “Crês isto?” (v. 26). E ela Lhe dá uma resposta cheia de fé: “Sim, Senhor, eu creio firmemente que tu és o Messias, o Filho de Deus, que devia vir ao mundo” (v. 27). Nesta resposta de Marta está a fé de toda a Igreja que crê em Jesus Cristo e na vida eterna que Ele nos proporcionou com Sua Páscoa, Sua morte e ressurreição.

É notável que Jesus operou a ressurreição de Lázaro no quarto dia. Jesus permanecerá no sepulcro três dias e no terceiro dia ressuscitará. No quarto dia Jesus já estará ressuscitado, já vive a vida nova que Ele proporciona à humanidade. Lázaro foi ressuscitado no quarto dia após a sua morte. Lázaro, assim, participa antecipadamente da ressurreição que Jesus veio proporcionar à humanidade. Este milagre, esta ressurreição, nos ajuda na preparação para a celebração da Páscoa de Jesus Cristo, que é nossa, também. Sim, Páscoa de Jesus é nossa, também, porque dela participamos, da mesma forma Lázaro foi ressuscitado. Graças a Jesus, desde o nosso Batismo, participamos da vida nova que Jesus nos proporciona, com Sua morte e ressurreição. Celebrar a Páscoa e, antes, viver a Quaresma, é contemplar o amor de Deus, é valorizar o Batismo que nos proporciona uma vida nova, é comprometer-se a viver uma vida nova sem pecados. E, quando o pecado ocorrer, Deus não nos nega o Seu favor, Deus não nos nega o Seu perdão. Por isso, a Quaresma é tempo, também, de revisão de vida, e de fazer a própria confissão.

A ressurreição de Lázaro é sinal da vida que não conhece mais a morte, e que nasce no homem por meio da fé, pois é Jesus Quem nos dá a vida eterna: “Todo aquele que vive e crê em mim não morrerá jamais”!

A 1ª leitura do profeta Ezequiel, assinala um dos momentos mais significantes da fé do Povo de Israel. Até o chamado “cativeiro da Babilônia” o Povo de Israel não tinha claro o conceito de Vida Eterna e de vida após a morte. Após da morte se acreditava que bons e maus iriam para o Xeol, que não é nem céu nem inferno, mas um “dormitório” para onde todos iam, indistintamente. Após o cativeiro da Babilônia (587 A.C) emerge a noção consciência de pecado, de retribuição pessoal, e de vida eterna. O profeta Ezequiel descreve o conceito de pessoa e de consciência pessoal: “Dar-vos-ei um coração novo e derramarei em vosso intimo um espírito novo” (Ez 36,26). Ezequiel assinala também, a responsabilidade pessoal do pecado (cf. Ez 18,20). O trecho que ouvimos na primeira leitura explica a visão precedente à revivificação dos ossos (cf. Ez. 37,1-10) A morte é, nesse trecho, figura do povo de Israel, vivendo no cativeiro, mais morto do que vivo (v. 11). A revivificação dos ossos é o gesto de Deus que reconduzirá o Povo de Israel de volta a sua terra. Posteriormente, em tempos mais recentes, esta visão de Ezequiel foi interpretada como a ressurreição dos mortos, pois, mais que a volta do exílio na Babilônia, a ressurreição dos Mortos é obra de Deus, de seu Espírito revivicador, e assinala a volta à plena comunhão com o Pai, como ouvimos na 2ª. leitura.

Na 2ª. leitura, ouvimos S. Paulo dizer que o Espírito de Cristo nos faz viver pela justiça, e que o Espírito dá a vida a nossos corpos mortais. O Espírito vivifica mesmo se o corpo está morto. O Espírito do Pai que ressuscitou o Cristo dos mortos fará viver até os nossos corpos mortais. A 2ª. leitura manifesta o cumprimento da profecia de Ezequiel, que ouvimos na 1ª. leitura: “Porei em vós o meu espírito para que vivais” (v. 14). Embora Ezequiel anunciasse a restauração política do Povo de Israel, que estava no cativeiro na Babilônia, na sua profecia se percebe uma nova criação, pois o Espírito dará um coração novo (cf. Ez 11, 19), voltado para Deus e para a Sua Aliança. S. Paulo disse [como ouvimos]: “Vós não viveis segundo a carne, mas segundo o Espírito se realmente o Espírito de Deus mora em vós. Se alguém não tem o Espírito de Cristo, não pertence a Cristo” (v. 9). O Espírito Santo prometido nos foi dado e, assim, nós nos tornamos novas criaturas (cf. Gl 6, 15; 2Cor 5, 17) através do Mistério Pascal de Cristo, Sua morte e ressurreição. A ação Espírito Santo proporciona o dom da vida, que só será perfeita quando cada um de nós participar definitivamente da vida do Ressuscitado [como ouvimos]: “Aquele – o Pai – que ressuscitou Jesus Cristo dentre os mortos vivificará também os nossos corpos mortais por meio do seu Espírito que mora em vós” (v. 11). Jesus prometeu [como ouvimos no Evangelho]: “Todo aquele que vive e crê em mim não morrerá jamais” (v. 26). Pai e Filho enviam o Espírito para que tenhamos fé, para que perseveremos nesta fé, para que vivamos segundo esta fé. Então, meus irmãos, que a nossa vida seja totalmente aberta ao Espírito de Deus, para que os frutos da ressurreição de Cristo penetrem a nossa vida presente, e nos conduzam à vida eterna. “Todo aquele que vive e crê em mim – diz o Senhor – não morrerá jamais”!

Meus Irmãos, chegamos ao fim do nosso itinerário quaresmal, e as celebrações pascais se aproximam, o Mistérios Pascal, o mistério de amor de Deus por nós, que não quer a nossa morte, mas a nossa salvação. Nestes cinco Domingos da Quaresma contemplamos a solidariedade de Deus ao assumir a nossa humanidade (I Domingo) e aos nos fazer participar de Sua glória (II Domingo); contemplamos que Jesus nos oferece a “água viva” que é seu Espírito, o Espírito Santo, para que sejamos adoradores do Pai “em espírito e em verdade” (III Domingo); contemplamos que Jesus é a “Luz do Mundo” e que nos faz enxergar o caminho da nossa salvação (IV Domingo); e hoje contemplamos que Jesus é a ressurreição e vida, e quem n’Ele crê viverá eternamente. Estes trechos do Evangelho selecionados para a Quaresma, como antes eu disse, deveriam intensificar a preparação daqueles que seriam batizados na Páscoa, mas também nos ajudam a refletir sobre o nosso Batismo, que é a nossa participação na Páscoa de Jesus Cristo nosso Salvador. Sábado Santo, na Vigília Pascal, faremos a renovação das promessas batismais, tendo sido preparados pela Palavra de Deus, especialmente proclamada nestes Domingos da Quaresma, pela oração, pelo exercício da caridade, e pela nossa confissão. Diante do Senhor ressuscitado, renovaremos as promessas do nosso Batismo, renovaremos a nossa profissão de fé que Ele é a ressurreição e a vida, e renovaremos o compromisso de viver e testemunhar esta fé, que ilumina a vida presente e nos conduz à vida eterna!

Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!

Por padre Ari Ribeiro – Doutor em Teologia, pároco da paróquia São Galvão, coordenador da catequese da Diocese de Santo Amaro (SP), membro da Equipe Regional do Ensino Religioso – Regional Sul 1 da CNBB.

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