Primeira pergunta – crianças e sofrimento
Foi formulada por uma menina japonesa de sete anos, chamada Elena, sobre o sentido da dor com base na vida e nos ensinamentos de Jesus, tendo como pano de fundo o terremoto e o tsunami que golpearam o país asiático. Filha de pai italiano, Elena estava no Japão durante o terremoto, viu morrer muitas crianças e ainda está assustada. “Por que devo ter tanto medo? Por que as crianças devem ter tanta tristeza? Peço ao Papa, que fala com Deus, para me explicar”, disse.
O Papa respondeu com docilidade à indagação da menina, dizendo que também ele se faz perguntas como essa e que nós não temos as respostas, “mas sabemos que Jesus sofreu como vós, inocentes, que o Deus verdadeiro que se mostra em Jesus está do vosso lado. Isso me parece muito importante, ainda que não tenhamos as respostas, se permanece a tristeza: Deus está do vosso lado, e estais seguros de que isso vos ajudará. E um dia poderemos também compreender por que foi assim. Nesse momento parece-me importante que saibais: ‘Deus me ama’, também se parece que nem me conheça. Pelo contrário, ele me ama, está do meu lado”, disse.
Bento XVI explicou para Elena que um dia será possível compreender que os sofrimentos não foram em vão, vazios, mas que por trás deles há um projeto bom, de amor. “Assegurai-vos de que nós estamos contigo, com todas as crianças japonesas que sofrem, desejamos auxiliar-vos com a oração, com os nossos atos e estejais seguras de que Deus vos ajuda. Rezamos juntos para que, sobre vós, venha a luz o quanto antes”.
Segunda pergunta – corpo e alma
Feita por uma mãe italiana chamada Maria Teresa, que desde a Páscoa de 2009 cuida de seu filho em estado vegetativo. Ela perguntou ao Papa se a alma de seu filho abandonou o corpo, uma vez que ele não é mais consciente, ou se ainda está com ele. “Certamente a alma ainda está presente no corpo”, respondeu o Papa, fazendo uma metáfora com um violão cujas cordas estão quebradas, de tal forma que não podem soar – da mesma forma, o instrumento do corpo é frágil, vulnerável, e a alma pode não “soar”, mas permanece presente.
“Estou certo de que essa alma escondida sente em profundidade o vosso amor, ainda que não compreenda os detalhes, as palavras, mas sente a presença de um amor. Por isso essa vossa presença, queridos pais, querida mãe, ao lado dele, horas e horas todos os dias, é um ato verdadeiro de amor de grande valor, também um testemunho de fé em Deus, no homem, de compromisso pela vida, também nas situações mais tristes. Portanto, encorajo-vos a continuar, a saber que fazeis um grande serviço à humanidade com esse sinal de confiança, com esse amor por um corpo lacerado, uma alma que sofre”.
Terceira pergunta – perseguição religiosa
Partiu de um grupo de sete jovens cristãos estudantes de Bagdá, no Iraque – região que sofreu vários ataques contra cristãos nos últimos meses e tornou-se terra de martírio. “Nós, cristãos de Bagdá, somos perseguidos como Jesus. Santo Padre, segundo o senhor, de que modo podemos ajudar a nossa comunidade cristã a reconsiderar o desejo de emigrar para outros Países, convencendo-a que partir não é a única solução?”
O Santo Padre revelou que reza todos os dias pelos cristãos do Iraque, irmãos sofredores de todos os cristãos, pelos quais é preciso fazer todo o possível para que permaneçam em sua própria terra. Nessa perspectiva, Bento XVI salientou que as pessoas e instituições que podem fazer algo pelos cristãos no Iraque devem fazê-lo de fato, citando o exemplo da Santa Sé, que permanece em diálogo contínuo não só com os católicos, mas também com outras comunidades cristãs e também muçulmanos. “Desejamos fazer um trabalho de reconciliação, de compreensão, também com o governo, porque é um problema uma sociedade profundamente dividida, lacerada. Deve-se reconstruir a consciência de que, na diversidade, todos tem um lugar próprio e uma história comum. Estejais certos da nossa oração”.
Quarta pergunta – Jesus, Mestre da Paz
Bintù, uma mulher muçulmana da Costa do Marfim, país em guerra, conta ao Papa que cristãos e muçulmanos sempre viveram em harmonia em seu país, mas o cenário político atual semeia divisões e discórdias. “Jesus é um homem de paz. O senhor, enquanto embaixador de Jesus, o que aconselharia para o nosso país?”
O Bispo de Roma disse ter recebido muitas cartas que mostram o sofrimento do povo da Costa do Marfim e que fica triste por poder fazer tão pouco. “No entanto, podemos fazer uma coisa, sempre: estar em oração convosco e, enquanto são possíveis, obras de caridade e sobretudo ajudar, segundo as nossas possibilidades, os contatos políticos, humanos”. O Papa recordou que para Bintù, muçulmana, Jesus é um profeta e sempre homem da paz: se poderia esperar que quando Deus viesse à terra fosse um homem de grande força para destruir as forças adversas. No entanto, ele vem “fraco”, somente com a força do amor, totalmente sem violência até se entregar na cruz
“Isso mostra o verdadeiro rosto de Deus, que a violência nunca vem de Deus, nunca ajuda a produzir coisas boas, mas é um meio destrutivo e não é o caminho para sair das dificuldades. Portanto, Deus é uma forte voz contra todo tipo de violência. E esta, cara Senhora, é a verdadeira mensagem de Jesus: buscai a paz com os meios da paz e deixai a violência”, salientou.
Quinta pergunta – Ressurreição
Um senhor italiano pergunta ao Papa o que acontece a Jesus no espaço de tempo entre a morte e a Ressurreição. “Uma vez que a Oração do Creio diz que Jesus, depois da morte, desceu aos Infernos, também pode-se pensar que algo do gênero acontecerá também a nós, após a morte, antes de ir ao Céu?”
De acordo com o Sucessor de Pedro, não de deve interpretar a descida de Jesus aos Infernos como uma viagem geográfica, como de um continente ao outro. Antes, é uma viagem da alma. Mesma que a alma de Jesus corresponda-se sempre ao Pai, esteja sempre em contato com o Pai, ao mesmo tempo essa alma humana se extende até os útimos confins do ser humano. O Senhor vai ao encontro dos perdidos, àqueles que já terminaram sua peregrinação terrena.
“A eficácia da Redenção não começa no ano zero ou 30, mas vai também ao passado, abraça o passado, todos os homens de todos os tempos. O homem, por si mesmo, não pode chegar à estatura de Deus. Portanto, a descida aos Infernos é uma parte essencial da missão de Jesus, da sua missão de Redentor e não se aplica a nós. A nossa vida é diferente, nós já fomos redimidos pelo Senhor e chegaremos diante do Rosto do Juiz, depois da morte, sob o olhar de Jesus, e esse olhar, por um lado, será purificador, e, por outro, nos tornará capazes de viver com Deus, de viver com os Santos, de viver em comunhão com os nossos queridos que nos precederam”, respondeu o Papa.
Sexta pergunta – Corpo glorioso
Um outro senhor italiano pergunta ao Papa sobre o que significa que o corpo ressuscitado de Jesus não tenha as mesmas características do de antes. “O que significa exatamente o corpo glorioso? E a ressurreição, para nós, será também assim?”
O Pontífice deixa claro que não se pode definir corpo glorioso porque está além das nossas experiências. No entanto, se podem registrar os sinais que Jesus dá sobre o tema: o primeiro é que o sepulcro está vazio. Nesse sentido, Jesus não deixou seu corpo à corrupção, mostrando que também a matéria está destinada à eternidade e assume-a em uma nova condição de vida. O segundo ponto, portanto, é que Jesus não morre mais, está para além das leis da biologia, da física, porque submissas a essas uma pessoa morre. Logo, é uma condição nova, a grande promessa para nós todos que há um mundo novo, uma vida nova, rumo à qual estamos a caminho.
Nessas condições, Jesus se deixa tocar, come com os seus, mas está além das condições da vida biológica. Não é um fantasma, mas verdadeiro homem, que vive uma verdadeira vida, mas uma vida nova. “Na Eucaristia, o Senhor dá-nos o seu corpo glorioso, não nos dá carne para comer no sentido da biologia, nos dá a si mesmo, essa novidade que Ele é, entra no nosso ser homens, no nosso ser pessoa, e nos toca interiormente com o seu ser, de tal forma que podemos deixar-nos penetrar pela sua presença, transformar pela sua presença. É um ponto importante, porque assim estamos já em contato com essa nova vida, esse novo tipo de vida. Penso que esse aspecto da promessa, da realidade que Ele se dá a mim e me leva para fora de mim, para o alto, é o ponto mais importante: não se trata de registrar coisas que não podemos compreender, mas de estar em caminho rumo à novidade que começa, sempre, de novo na Eucaristia”.
Sétima pergunta – Maria
Na última pergunta, feita pelo apresentador do programa, Rosario Carello, o Santo Padre fala sobre o diálogo travado entre Maria, João e Jesus sob a cruz. Carello pergunta como compreender as palavras “Eis o teu filho” e “Eis a tua Mãe”. Qual o significado de terem sido pronunciadas naquele momento e que significado têm também hoje? Além disso, o apresentador questionou se o Papa sente no coração o desejo de renovar uma consagração à Virgem no início do novo milênio?
Bento XVI destacou que as palavras de Jesus são sobretudo um ato muito humano. No Oriente daquele tempo, uma mulher sozinha era uma situação impensável. Logo, Jesus confia sua mãe a João para que ela esteja segura. “Isso me parece muito belo, muito importante, que antes de toda a teologia vejamos nisto a verdadeira humanidade, o verdadeiro humanismo de Jesus”, disse. No entanto, tal gesto não diz respeito somente àquele momento, mas compreende toda a história. Em João, Jesus confia toda a Igreja e seus membros à Mãe e, por sua vez, a Mãe a nós. Ao longo da história, isso foi se concretizando cada vez mais, com o aprofundamento da consciência de que Maria é uma verdadeira mãe para todos os cristãos, como provam os santuários espalhados e a devoção disseminada em todo o mundo.
Para os que defendem a “falta de fundamento bíblico” para a devoção mariana, o Papa disse: “Aqui responderei com São Gregório Magno: ‘Com a leitura crescem as palavras da Escritura’, isto é, desenvolvem-se na realidade, crescem, e sempre mais na história se desenvolve essa Palavra. E podemos com grande confiança buscar esta Mãe. Por outro lado, vale ressaltar também que a Mãe exprime também a Igreja. Não podemos ser cristãos sozinhos, com um cristianismo construído segundo a minha ideia. A Mãe é imagem da Igreja, da Mãe Igreja, e confiando-nos a Maria devemos confiar-nos também à Igreja, viver a Igreja, ser a Igreja com Maria”.
Com relação à renovação da consagração do mundo à Virgem no início do novo milênio, o Santo Padre lembrou que os Papas – como Pio XII, Paulo VI, João Paulo II – fizeram um grande Ato de Confiança a Nossa Senhora, muito importante diante da humanidade e de Maria mesma. “Eu penso que agora seja importante interiorizar esse ato, de deixar-nos penetrar, de realizá-lo em nós mesmos. Penso que o ato grande, público, foi feito. Talvez um dia seja necessário repeti-lo, mas no momento me parece mais importante vivê-lo, realizá-lo, entrar nessa confiança, para que seja realmente nossa. A confiança comum em Maria, o deixar-se penetrar por essa presença e formar, entrar em comunhão com Maria, torna-nos Igreja, torna-nos, juntamente com Maria, realmente essa esposa de Cristo. Portanto, no momento não teria a intenção de um novo Ato de Confiança público, mas gostaria de convidar a entrar na confiança já proclamada, para que seja realmente vivida por nós a cada dia e cresça assim uma Igreja realmente mariana, que é Mãe, Esposa e Filha de Jesus”.
O Programa
“O Papa responde” foi uma edição especial do programa “A sua imagem – Perguntas sobre Jesus” na qual o Pontífice esclareceu a questionamentos formulados por pessoas em geral, não necessariamente cristãs, sobre a fé católica e a figura de Cristo – à qual o Papa já dedicou duas obras recentes da série Jesus de Nazaré e uma terceira está em preparação -, bem como alguns temas da vida humana no mundo atual, afetado por desastres naturais e perseguições religiosas.
As perguntas foram formuladas ao Santo Padre através de uma vídeo-mensagem, que foi retransmitida em um monitor instalado em sua Biblioteca do Palácio Apostólico, onde foi realizada a gravação da entrevista na quarta-feira, 20. A transmissão pela RaiUno começou às 14h10 (horário de Roma – 9h10 no horário de Brasília).
Por Leonardo Meira, da Canção Nova Notícias