“Os jovens gostam de rezar?”, por frei Patrício Sciadini

“Os jovens gostam de rezar?”, por frei Patrício Sciadini

Não há dúvida que os jovens são a grande força do amanhã em todos os campos. O amanhã depende dos jovens que hoje se preparam para assumir os cargos políticos ou de trabalho e também na Igreja. O Papa de amanhã é um jovem de hoje que, desejoso de se doar a Deus, encaminha-se pela estrada do sacerdócio; será um dia escolhido para ser Bispo, depois Cardeal e, enfim, entre tantos participantes de um conclave, será eleito Papa, então guiará a Igreja pelos novos caminhos da história. Não há como fugir desta lei tão simples e tão fundamental da vida.

Os jovens gostam de rezar?

Nas minhas andanças por este Brasil e mundo afora, tem me dado grande alegria conhecer jovens que têm gosto pela oração. Todo jovem é como vinho novo, que tem sua efervescência e vitalidade; coloca em tudo o que faz entusiasmo e vida, sabe experimentar a presença de Deus como o consolador e confortador, aquele que vem ajudar em todos os momentos da vida.
O jovem deixa-se envolver pelo entusiasmo e todos os seus sentimentos cantam a alegria da vida. A espontaneidade juvenil é o que mais toca aos que os olham enquanto rezam. Escutar as orações dos jovens é ver-se envolvido em tantos sentimentos fugazes e profundos ao mesmo tempo. O jovem não sabe deixar-se envolver pela reflexão, ele é sempre aquele grito de amor apaixonado; é também o grito da revolta diante de tantas situações que levam a marca do sofrimento, da fome, da miséria e do desespero.

Não há dúvida que os jovens sentem-se à vontade nos movimentos carismáticos, porque aí encontram o seu “lugar e espaço sagrados” para exteriorizar tudo o que se passa dentro deles. É na dança, na coreografia religiosa, no teatro, nos cantos alegres e amorosos que tudo se faz vida e experiência de amor. O sorriso e as lágrimas se misturam numa sóbria sabedoria. Nós, mais adultos, precisamos parar um pouco, sair de nós mesmos e voltar à nossa juventude para assim compreender a oração dos jovens de hoje. Não podemos contemplar somente de longe, é preciso deixar-se envolver e, quando não os compreendemos, assumir uma atitude de silêncio, de respeito por aquilo que se passa dentro do coração deles…

Quais são os problemas que atormentam o coração do jovem?

Todo jovem gosta de encontrar amigos e, em determinados momentos da vida, sente-se terrivelmente sozinho e reclama diante de Deus por isso; e pede amigos para partilhar a vida, para vencer a solidão, para sentir-se parte do mundo que lhe parece grande demasiado, para não se perder.

A solidão é terrível em qualquer etapa da vida, mas especialmente na juventude. Lembro que, quando era jovem, isto é, 40 anos atrás… tantas vezes me surpreendia silenciosamente e com os olhos fixos para o céu, pedindo a Deus a graça de encontrar amigos que me ajudassem a me abrir à vida e me ensinassem a vencer os momentos de solidão. Era pastor e sempre ocupado com as minhas ovelhas, que não me ajudavam muito a compreender os problemas da vida; elas estavam ocupadas em procurar alimento e eu, pobre também, me recordava de vez em quando que estava com muita fome… mas o desejo de ter amigos era muito grande… Depois, escutando as orações dos jovens, me convenci que todo “jovem normal” sente o desejo de sair do seu mundo pequeno e restrito, de fugir dos que não o entendem e buscar alguém que possa acolhê-lo.

Como eu rezava quando era jovem…

Este artigo me tem obrigado a parar e voltar no tempo, quando tinha entre 15 e 23 anos, no início da minha vida carmelitana; a oração passou por tantas modificações que às vezes não é fácil me reconhecer no que desejava, no que pedia e na forma como pedia. O mesmo percebemos lendo a “História de uma alma”, de Santa Teresinha do Menino Jesus, identificamos como ela, voltando no tempo, tenta recordar como rezava quando se encontrava no mosteiro das Irmãs Beneditinas, “escondia-se atrás da cortina, e dizia que estava pensando”. Também lendo as primeiras cartas dela notamos que a sua oração foi evoluindo até a sua maturidade espiritual.

Gostaria de evidenciar alguns aspectos da minha oração juvenil para que os jovens possam também se reconhecer nesse estado de espírito que eu vivia.

Deus, para mim, aos 15 anos, era o Senhor do mundo, que deveria atender meus pedidos: uma vida melhor economicamente, porque minha mãe era pobre e viúva e não podia me dar o que eu via em meus colegas e eu não podia me permitir aquele luxo. A pergunta que surgia era a seguinte: “Por que os outros podem e eu não; por que Deus está sendo injusto comigo, que sou um menino ‘órfão’, sofrido e sem ninguém?” Recordo que esse tipo de oração era muito freqüente e às vezes achava justo ter inveja e ciúme dos outros, e quando Deus não me dava o que desejava, batia os pés e fazia todo tipo de mortificações que podia. Tinham-me ensinado que sem sacrifício Deus não atende… Os jovens de hoje também são capazes de fazer qualquer sacrifício físico, jejuns, para obter de Deus a graça. Aos quinze anos a graça era querer “arrancar” com força os benefícios divinos.

A riqueza me fascinou por pouco tempo. Também pedi a Deus, mas muito de passagem, a graça de ter uma família, porém quase imediatamente me apaixonei pela vida religiosa.

A minha oração era querer uma vida diferente e suplicava ao Senhor que Ele me desse a possibilidade de sair de casa. Queria ser padre, provavelmente em mim aconteceu o que acontece ainda com tantos jovens: achava que o padre tinha uma vida tranquila, cômoda, não lhe faltava nada e ele não tinha problemas… O exemplo do meu vigário suscitava em mim o desejo de imitá-lo. Ele tinha uma boa voz e eu me esforçava, indo atrás do rebanho, para cantar, mas… nisto não vinguei e continuo a ser mais desentoado que sino rachado. Mas tudo isso fazia parte de minha vida e sonhava, sonhava, sonhava… com uma vida de vigário, dirigindo uma paróquia e estando à frente dos fiéis. Sonho que também nunca se realizou, porque mais tarde pedi ao Senhor a vida religiosa; achava esta mais bonita e pensava que os religiosos fossem mais santos que os diocesanos… mas também vi que isso nem sempre é verdade.

Pedi ao Senhor para estudar, ser inteligente, gostava de ler e queria saber tudo de cor. Havia em mim grandes sonhos e desejos que sempre pedia como criança diante do Senhor.

Outro aspecto de minha oração era a preocupação com os pobres. Ficava indignado quando via as injustiças acontecerem entre os “sem voz nem vez”. Então rezava ao Senhor para que fizesse justiça, que ajudasse os pobres a ter o mínimo necessário para sobreviver, que lhes proporcionasse meios para melhorar de vida.

A espontaneidade é outro aspecto da minha oração juvenil. Como todo jovem, eu era o que era e não media as palavras para falar com Deus. E Ele sempre me entendeu.

Há, no coração de jovem, sonhos e ideais que nem sempre são possíveis de expressar; são os momentos de silêncio que nos permitem ver o nosso rosto como num espelho embaçado, sem nitidez…

Mais tarde, duas jovens carmelitas descalças me ajudaram a compreender a oração dos jovens: Santa Teresa de Los Andes, que entrou no Carmelo aos 19 anos e morreu antes de completar 20; o seu diário traça o perfil de uma jovem generosa, desejosa de ser amada e de amar, que encontra no Senhor toda a sua alegria, aquele Deus que ela gosta de chamar “Deus, alegria infinita”. A outra é Elisabeth da Trindade, que entrou no Carmelo de Dijon – na França – aos 21 anos e lá sentiu bem forte a presença de Deus, descobrindo-o como “habitante do seu coração”; ela o chamava carinhosamente “o meu três”. “É tão linda esta presença de Deus! Como gosto de encontrá-la aqui, no mais profundo do meu ser, no céu da minha alma, pois Ele jamais me abandona… Parece-me ter encontrado o meu céu na terra, porque o céu é Deus e Deus está na minha alma. O dia em que compreendi isto, tudo se iluminou dentro de mim e muito gostaria de sussurrar este segredo àqueles que amo.”

O que dizer aos jovens:

Hoje, teria um conselho para dar aos jovens: não importa o que se passa dentro do coração, o que importa é sentir Deus como o amigo que nos escuta e nos acolhe em qualquer momento: antes, durante e depois das fugas; como o pai da parábola, quando voltamos, Deus se lança ao nosso pescoço, nos abraça e nos cobre de beijos…

A oração de todo jovem deve, continuamente, ser “borbulhante” como vinho novo, cheia de sentimentos contraditórios, mas sinceros. Que a oração do jovem surja de sua vida e que possa apresentar a Deus o que dentro dele se passa.

Nos retiros que ministro para jovens, tenho-lhes aconselhado a “escrever” para Deus o que gostariam de dizer a Ele. Na leitura dessas orações, percebe-se o que se passa dentro deles; são orações que despertam em nós grandes interesses. Recordo uma oração que dizia: “Senhor, tu és um cara legal, bom, mas tens um defeito: fazer-me esperar demais pelo que te peço; já estou desanimado de pedir”.

Outro queria que Deus lhe arrumasse uma namorada; a pedia tão perfeita que, provavelmente, diante dela Deus mesmo perderia a sua perfeição. São desejos de jovens que Deus compreende. O que importa é saber que a oração tem sua expressividade em cada idade, e Deus é totalmente o Outro que nos escuta sempre de forma personalizada e própria.

Não há esquemas para rezar, é deixar o coração amar e desabafar, e quem melhor do que um jovem sabe fazer isso? Que os jovens continuem a ser eles mesmos e a surpreender-nos com suas orações corajosas, ousadas, cheias de entusiasmo e de lágrimas… E que Maria, boa educadora de Jesus jovem, continue a educar todos os jovens na escuta do Evangelho e de tudo o que Jesus continua a dizer para todas as idades e épocas da história.

Frei Patrício Sciadini, ocd

Sacerdote carmelita, italiano, feliz e apaixonado pelo Brasil. Profundo conhecedor da espiritualidade carmelitana e um apaixonado por Santa Teresa d’Ávila.

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